Entre os séculos XV e XVIII, o caminho do conhecimento percorrido pela arte e pela ciência se entrelaça em muitas ocasiões. O Ocidente encontra-se em uma fase de transformação dos conhecimentos, fase destinada a estruturar os campos científicos e o das ciências humanas de uma maneira bastante diferente daqueles medievais. Costuma-se, ainda hoje, colocar uma cisão, no âmbito do Renascimento e do pensamento humanista, que tende a mostrar uma dialética extrema entre o pensamento religioso e espiritual de um lado e o pensamento científico e empírico do outro, mas o que a história propõe é mais complexo e estruturado do que esta visão de cunho didático. De fato, os processos de formação da ciência se apresentam em constante sobreposição das duas visões, na tentativa de não construir esta oposição e de organizar as produções de materiais escritos, desenhados e tridimensionais dentro de projetos ideológicos capazes de contemplar, de maneira dúplice, tanto as exigências espirituais quanto as evidências empíricas da observação do mundo natural. Nesse capítulo queremos pensar de que maneira se constrói a representação da memória (seus objetos, seus materiais) no cruzamento entre novas observações e tradição. Consideramos que a construção dos novos conhecimentos científicos, observada através dos materiais artísticos voltados para os usos científicos e memoriais, pode ilustrar de maneira mais efetiva os processos de produção da ciência moderna e, consequentemente, dos patrimônios científicos, tecnológicos e industriais (a partir do século XIX) que pedem, hoje, narrativas coerentes com suas configurações. Inicialmente, abordaremos o tema através de algumas reflexões sobre a ciência medieval, procurando entender como esta lida com o mundo natural. Em um segundo momento, nos concentraremos sobre um aspecto particular da produção de conhecimento e de artefatos, o da anatomia, observada enquanto topos científico na Modernidade, buscando identificar seus objetos e os sentidos a eles atribuídos. Em um terceiro momento, trataremos de algumas imagens artísticas que se incumbiram de ilustrar ideias e ideologias ligadas à ciência, procurando enfocar suas transformações, na medida em que, ao longo do século XVIII, observa-se um deslocamento de interesse do corpo e da Natureza para a ideia de “maquina” como centro das reflexões. A partir daí, através da Revolução Industrial, poderemos falar de um novo espaço de interesse, que transforma a ciência em tecnologia em termos de produção de objetos capazes de “carregar” a ideologia do progresso. Por último, desenharemos um breve histórico do conceito de arqueologia industrial, para problematizarmos a noção de Patrimônio industrial.

Crippa, G. (2020). TEORIA DOS OBJETOS E DAS COLEÇÕES PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA. Recife : Universidade Federal de Pernambuco.

TEORIA DOS OBJETOS E DAS COLEÇÕES PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA

Crippa, Giulia
2020

Abstract

Entre os séculos XV e XVIII, o caminho do conhecimento percorrido pela arte e pela ciência se entrelaça em muitas ocasiões. O Ocidente encontra-se em uma fase de transformação dos conhecimentos, fase destinada a estruturar os campos científicos e o das ciências humanas de uma maneira bastante diferente daqueles medievais. Costuma-se, ainda hoje, colocar uma cisão, no âmbito do Renascimento e do pensamento humanista, que tende a mostrar uma dialética extrema entre o pensamento religioso e espiritual de um lado e o pensamento científico e empírico do outro, mas o que a história propõe é mais complexo e estruturado do que esta visão de cunho didático. De fato, os processos de formação da ciência se apresentam em constante sobreposição das duas visões, na tentativa de não construir esta oposição e de organizar as produções de materiais escritos, desenhados e tridimensionais dentro de projetos ideológicos capazes de contemplar, de maneira dúplice, tanto as exigências espirituais quanto as evidências empíricas da observação do mundo natural. Nesse capítulo queremos pensar de que maneira se constrói a representação da memória (seus objetos, seus materiais) no cruzamento entre novas observações e tradição. Consideramos que a construção dos novos conhecimentos científicos, observada através dos materiais artísticos voltados para os usos científicos e memoriais, pode ilustrar de maneira mais efetiva os processos de produção da ciência moderna e, consequentemente, dos patrimônios científicos, tecnológicos e industriais (a partir do século XIX) que pedem, hoje, narrativas coerentes com suas configurações. Inicialmente, abordaremos o tema através de algumas reflexões sobre a ciência medieval, procurando entender como esta lida com o mundo natural. Em um segundo momento, nos concentraremos sobre um aspecto particular da produção de conhecimento e de artefatos, o da anatomia, observada enquanto topos científico na Modernidade, buscando identificar seus objetos e os sentidos a eles atribuídos. Em um terceiro momento, trataremos de algumas imagens artísticas que se incumbiram de ilustrar ideias e ideologias ligadas à ciência, procurando enfocar suas transformações, na medida em que, ao longo do século XVIII, observa-se um deslocamento de interesse do corpo e da Natureza para a ideia de “maquina” como centro das reflexões. A partir daí, através da Revolução Industrial, poderemos falar de um novo espaço de interesse, que transforma a ciência em tecnologia em termos de produção de objetos capazes de “carregar” a ideologia do progresso. Por último, desenharemos um breve histórico do conceito de arqueologia industrial, para problematizarmos a noção de Patrimônio industrial.
2020
Cadernos do patrimônio da ciência e tecnologia: epistemologia e políticas / organização
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66
Crippa, G. (2020). TEORIA DOS OBJETOS E DAS COLEÇÕES PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA. Recife : Universidade Federal de Pernambuco.
Crippa, Giulia
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