A noção de bem-estar e a sua relação com o trabalho têm uma história longa e não linear. Bem-estar, nas línguas latinas, é uma palavra composta por “bem” (advérbio de intensidade, cuja origem é bónus e significando um alto grau) e pelo verbo “estar” (“existir, viver”). Este termo aparece no século XVI para designar a satisfação de necessidades físicas. A partir do século XVIII, ele designa a situação material que permite satisfazer as necessidades da existência. Estes significados, que se difundiram na linguagem comum, estão também na origem da noção de bem-estar em economia, em sociologia e nas ciências políticas. Todavia, o bem-estar adquire um significado diferente, a partir de meados do século XX, através de uma definição que muda a ordem dos valores relativamente à noção própria das ciências sociais. A Organização Mundial de Saúde (OMS), desde a sua constituição na segunda metade dos anos 40, exprime a ideia da “saúde” formulada em termos de bem-estar físico, mental e social. O trabalho é directamente implicado nesta concepção inovadora da saúde. O Comité misto OIT/OMS da saúde no trabalho formulou, em 1995, uma “definição de saúde no trabalho” que assenta sobre estes mesmos princípios. Uma directiva europeia (n. 391/1989), transposta nas leis nacionais dos Estados membros da União, prescreveu uma prevenção primária, geral, programada, e integrada na concepção do trabalho. A prevenção é “primária”, já que se opõe à manifestação do risco: é o nível mais alto de prevenção, relativamente à acção que diz respeito ao risco existente ou, pior, ao dano. Por este facto, o quadro normativo que prescreve a acção preventiva primária impõe uma análise e uma intervenção de forma iterativa, fundadas sobre critérios objectivos e articuladas de forma exaustiva sobre a totalidade da situação de trabalho, visando o controlo da saúde e da segurança dos trabalhadores. Fora da União Europeia, diferentes Países decretaram normas semelhantes. As teorias que pressupõem a predeterminação do sistema não podem integrar o bem-estar no sentido indicado pela OMS. Mas já não são as teorias do “actor” que podem fornecer as ferramentas para uma concepção do trabalho, integrando a prevenção primária. Para estas teorias, a situação de trabalho é uma “realidade socialmente construída”, reconhecível a posteriori: o actor opõe-se ao sistema, mas desde que este último existe, com os seus constrangimentos. A definição da OMS do bem-estar como processo aperfeiçoável, requer uma teoria que concebe o trabalho, por sua vez, como processo, intencional, sempre em mudança e susceptível de melhoria, para permitir integrar o bem-estar na sua concepção e na sua transformação contínua, pelos próprios sujeitos implicados. Eis o desafio das disciplinas do trabalho face ao bem-estar.

Bem-estar/Bienestar / B.Maggi. - In: LABOREAL. - ISSN 1646-5237. - ELETTRONICO. - 2 (1):(2006).

Bem-estar/Bienestar

MAGGI, BRUNO
2006

Abstract

A noção de bem-estar e a sua relação com o trabalho têm uma história longa e não linear. Bem-estar, nas línguas latinas, é uma palavra composta por “bem” (advérbio de intensidade, cuja origem é bónus e significando um alto grau) e pelo verbo “estar” (“existir, viver”). Este termo aparece no século XVI para designar a satisfação de necessidades físicas. A partir do século XVIII, ele designa a situação material que permite satisfazer as necessidades da existência. Estes significados, que se difundiram na linguagem comum, estão também na origem da noção de bem-estar em economia, em sociologia e nas ciências políticas. Todavia, o bem-estar adquire um significado diferente, a partir de meados do século XX, através de uma definição que muda a ordem dos valores relativamente à noção própria das ciências sociais. A Organização Mundial de Saúde (OMS), desde a sua constituição na segunda metade dos anos 40, exprime a ideia da “saúde” formulada em termos de bem-estar físico, mental e social. O trabalho é directamente implicado nesta concepção inovadora da saúde. O Comité misto OIT/OMS da saúde no trabalho formulou, em 1995, uma “definição de saúde no trabalho” que assenta sobre estes mesmos princípios. Uma directiva europeia (n. 391/1989), transposta nas leis nacionais dos Estados membros da União, prescreveu uma prevenção primária, geral, programada, e integrada na concepção do trabalho. A prevenção é “primária”, já que se opõe à manifestação do risco: é o nível mais alto de prevenção, relativamente à acção que diz respeito ao risco existente ou, pior, ao dano. Por este facto, o quadro normativo que prescreve a acção preventiva primária impõe uma análise e uma intervenção de forma iterativa, fundadas sobre critérios objectivos e articuladas de forma exaustiva sobre a totalidade da situação de trabalho, visando o controlo da saúde e da segurança dos trabalhadores. Fora da União Europeia, diferentes Países decretaram normas semelhantes. As teorias que pressupõem a predeterminação do sistema não podem integrar o bem-estar no sentido indicado pela OMS. Mas já não são as teorias do “actor” que podem fornecer as ferramentas para uma concepção do trabalho, integrando a prevenção primária. Para estas teorias, a situação de trabalho é uma “realidade socialmente construída”, reconhecível a posteriori: o actor opõe-se ao sistema, mas desde que este último existe, com os seus constrangimentos. A definição da OMS do bem-estar como processo aperfeiçoável, requer uma teoria que concebe o trabalho, por sua vez, como processo, intencional, sempre em mudança e susceptível de melhoria, para permitir integrar o bem-estar na sua concepção e na sua transformação contínua, pelos próprios sujeitos implicados. Eis o desafio das disciplinas do trabalho face ao bem-estar.
2006
Bem-estar/Bienestar / B.Maggi. - In: LABOREAL. - ISSN 1646-5237. - ELETTRONICO. - 2 (1):(2006).
B.Maggi
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